11/9: a primeira década da (nova) história

Nova York, anos 70. (Foto: The New York Times)

Acho que era dia de prova na escola, por isso saí tão cedo. Lembro de, enquanto voltava para casa, parar em um barzinho da esquina, porque algo chamava a atenção. Era o aparelho de TV, que mostrava um prédio pegando fogo. Mal sabia eu, bem como a maioria do planeta que estava em frente a um televisor, naquela terça-feira de setembro, que estávamos nos transformando em testemunhas da história.

Várias histórias passaram a ser contadas de outra forma, após o 11 de setembro. Uma delas, talvez a principal, foi o terremoto que a ousadia da Al-Qaeda causou, não apenas fisicamente. Os brios dos americanos, tradicionalmente acostumados a se sentirem no topo do mundo, em vários aspectos, foram destroçados por aqueles quatro aviões. A imagem de perfeição da maior potência do mundo ruiu, junto com as duas torres. O dicionário dos americanos passou a definir uma palavra, que nem sequer passava pela cabeça deles: vulnerabilidade.
Outras palavras, como terrorismo, medo, trauma, queda, todas estas e mais enriqueceram o vocabulário de um povo tão pobre em esperanças, tão menos seguro. Exclusividade yankee? Muito pelo contrário. Se até os Estados Unidos, vejam bem, os ESTADOS UNIDOS foram atacados, que dirá o nosso Cristo Redentor, o Palácio do Planalto…
Um presidente eleito sob suspeitas, com a obrigação de segurar a América após a tragédia, George W. Bush partiu para o ataque contra o Afeganistão, contra o Iraque, contra meio Oriente Médio, partindo da premissa de “combate ao terror”. Ora, um país acostumado a protagonizar grandes guerras, agora instaurava uma, no papel de vítima, totalmente inédito. Difícil saber quem sofreu mais. Se os parentes de quem perdeu a vida no World Trade Center, no Pentágono e na Pensilvânia, ou se os Estados Unidos como império da segurança e do ego inflado de quem sempre se orgulhava do papel de vencedor.
Ninguém venceu.
Nestes últimos dez anos, entrar e sair do país se tornou operação de guerra. O esquema de segurança foi reforçado, excessivamente ou necessariamente, para evitar situações parecidas. Os alvos mais visados ganharam atenção especial. Ameaças biológicas, como o Antrax, se tornaram foco de estudo e discussão entre os médicos e cientistas de todo o planeta. O mundo árabe, com seus desejos, manifestos de maneiras cada vez mais sangrentas, ganharam destaque na imprensa, nos livros de história, nas discussões políticas. Quem não os via, agora os teme.
No Iraque e no Afeganistão, as batalhas contra os grupos extremistas, que talvez mascarassem as reais intenções estadunidenses, deixaram um rombo na economia, duzentos mil civis mortos e dividiu opiniões. Uns concordam com a invasão, defendendo a idéia de proteção da soberania nacional. Outros condenam as guerras, que só serviriam de isca para outros atentados. Uma certeza se manteve intacta: tudo mudou.
As relações políticas, institucionais, internacionais, internas, interplanetárias, tudo mudou. O que era poder absoluto se tornou dubitável. A incompreensão entrou na discussão, a religião e os conflitos entre mundos distintos ganharam valia, por parte dos grandes chefes de Estado mundo afora. Eles não estavam de brincadeira. Faltava apenas um grande ato para mostrar ao planeta do que um povo é capaz, por vingança, por respeito, seja pelo que for.
Três mil vidas foram ceifadas, pessoas foram elevadas a categoria de heróis, outras desceram ao limbo dos vilões, e não se fala mais em supremacia como antes. Atentados em Londres, em Madri, recessão e crise econômica global, mudanças no cenário político do planeta, tudo fruto, de alguma forma, daqueles atentados.
Até mesmo o crescimento o Brasil, por que não dizer? A ALCA, famigerado projeto de George Bush, o pai, deixou de ser executado pelo seu filho, em prol da luta anti-terror. As prioridades mudaram, e nós nos livramos, por hora, do fantasma da submissão eterna. Eu concordo, ainda não deixamos de ser colônia, mas já fazemos algum barulho.
Não apenas os corações militar e econômico dos Estados Unidos foram atingidos naquele dia. Idéias, prospecções, preconceitos, sentimentos também viraram cinzas, ao redor do mundo. Perguntas surgiram, respostas não respondiam mais, verdades se tornaram mentiras, o real e a ficção se misturaram naquele roteiro que nenhum cineasta conseguiria imaginar, no auge de sua genialidade. Aqueles aviões acertaram cada um de nós, o fogo arde até hoje, e o eco daquele 11 de setembro de 2001 ainda assombrará muitas outras gerações.

Esses foram apenas os dez primeiros anos da nova história da humanidade.

Nova York, 2011. (Foto: Mark Lenninham/AP)
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