Mãos dadas, olhos abertos e corações solidários

Grupo Mãos Dadas Belém leva alimento par ao corpo e para a alma de pessoas que vivem em situação de rua, em Belém. 

Gustavo Ferreira

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Foto: Divulgação

PROJETO MOVENTE_Marca ColoridaA rua é espaço de encontros, de travessia, de passagens. A rotina, por vezes, nos impede de percebê-la em seus detalhes. Passamos, não ficamos. Mas, e pra quem a rua é casa? Vidas que se incorporam ao asfalto, aos viadutos, aos becos, e muitas vezes viram detalhes, que passam despercebidos. Pessoas cujos destinos, por vários – e duros – motivos, terminam ali, onde o teto é o céu, ou no máximo uma marquise. Quem são essas pessoas? Do que elas realmente precisam?

É fácil e correto que a resposta imediata seja “comida”, ou “cobertores”. Mas não é só isso. A fome de quem mora nas ruas é também de arte, de sorrisos. Fome de atenção. É saciar esses desejos que move um grupo aqui de Belém, formado por estudantes e voluntários. Todos juntos, de mãos dadas. Não por acaso, o nome do projeto é Mãos Dadas Belém.

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Caroline Lira (Foto: Acervo Pessoal)

A ideia de criar um grupo de apoio solidário surgiu em uma palestra de literatura em 2014. O professor e criador do projeto lá em São Paulo, Maurício Soares Filho, veio à capital e, ao falar sobre a iniciativa, encantou e inspirou, como lembra Caroline Lira, coordenadora licenciada do Mãos Dadas Belém: “Ele falou sobre o projeto com tanto carinho e amor e na hora a gente se identificou porque procurávamos um trabalho que enchesse nosso coração desse jeito, e que fosse mais do que levar comida pra rua. Nosso intuito sempre foi levar algo a mais, levar arte, o Maurício fazia isso em São Paulo por meio de poemas e a gente decidiu abraçar a ideia aqui. Entramos em contato com ele pra trazer pra Belém uma espécie de ‘filial’, ele super apoiou a ideia e estamos aqui há 3 anos”.

Mais do que levar comida às pessoas em situação de rua, o Mãos Dadas Belém foca suas ações na promoção de sorrisos, com espetáculos de palhaços, que animam e divertem quem vive uma realidade tão dura. Além disso e da distribuição de alimentos, há também a oferta de produtos de higiene. Nesse tempo, já foram mais de trinta ações realizadas, em praças como a Felipe Patroni e a Waldemar Henrique, no Ver-o-Peso e em localidades de bairros como São Brás. O Mãos Dadas Belém também já chegou à ilha de Outeiro e a Santo Antônio do Tauá, no nordeste paraense.

Natália Aguiar é uma das atuais coordenadoras, e fala da sensação de partilhar com os moradores das ruas: “O que nos motiva é saber que, pelo menos nos dias em que atuamos, aquelas pessoas se sentirão acolhidas. Não só vão receber comida, um kit de higiene ou ver um espetáculo de palhaços, mas ser enxergadas, amadas. A esperança nos motiva. Esperança de que eles recebam todo amor que temos para lhes dar”.

Carolina Ventura_Perfil
Carolina Ventura (Foto: Acrevo pessoal)

A esperança de humanizar aquelas vidas que, como no início desse texto, viram detalhes que passam, que quase ninguém vê. “O que eles mais precisam é de um olhar que os enxerguem. As pessoas passam cotidianamente por eles e não os enxergam, o que acarreta na desumanização dessas pessoas”, afirma Natália. E quem arremata é outra coordenadora do Mãos Dadas Belém, Carolina Ventura: “Acreditamos que, por meio da arte, podemos levar aquilo que geralmente é excluído a essas pessoas, que é o direito ao acesso à arte, ao teatro, à palhaçaria”.

“O que eles mais precisam é de um olhar que os enxerguem” – NATÁLIA AGUIAR, coordenadora do Mãos Dadas Belém

Ajudar é a missão do grupo, que hoje conta com seis coordenadores fixos, todos estudantes, e pelo menos vinte voluntários fixos. Só que, mesmo com tanto ímpeto, a missão é difícil. Da mão de obra para o preparo dos alimentos, até a captação de lençóis, um dos itens de maior necessidade, a batalha se repete a cada nova ação. Mas o grande enfrentamento é da resistência de alguns: “a resistência se dá, principalmente, pelo fato do público alvo ser as pessoas em situação de rua”, conta Natália Aguiar.

Natália Aguiar_Perfil
Natália Aguiar (Foto: Acervo pessoal)

E são muitos nessa situação. Uma pesquisa da Universidade Federal do Pará revelou que, em 2014, apenas em Belém e Ananindeua, havia 583 pessoas em situação de rua. Reflexo de um panorama de extrema desigualdade social. E onde está a solução? Na opinião de Natália, “para que se diminua o número de pessoas que estão nessa conjuntura é preciso que haja políticas públicas efetivas que estudem a historicidade, a origem, os fatores que levam as pessoas para as ruas, os fatores que impedem as mesmas de saírem dela, para que, assim, haja conhecimento da população que se deseja atingir”. E completa: “O que se vê hoje das poucas políticas que atendem esse público alvo é a falta de efetividade e, consequentemente, a falta de resultados”.

Se faltam resultados, sobra disposição para continuar, “fica o dever de resistir. Resistir a essa ideia marginalizada das pessoas em situação de rua. Resistir à indiferença a essas pessoas, ao preconceito”, reforça Natália. As ações de 2018 estão sendo definidas, e para fazer parte desse movimento, basta procurar a coordenação pela fanpage do Mãos Dadas Belém para ser voluntário, fazer doações ou, simplesmente, compartilhar essa causa.

*** O Repórter E solicitou à Prefeitura de Belém um posicionamento sobre as ações da gestão municipal com pessoas em situação de rua, mas até o fechamento dessa reportagem não houve retorno.

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